A convenção do PT que apontou Dilma Rousseff como pré-candidata à presidência da República é um evento pleno de significados. No campo dos discursos, podemos identificar três dimensões claras. A ideológica, onde se deu o embate de posições dos vários setores que integram o PT. A eleitoral, onde o discurso visa a disputa eleitoral e, sobretudo, atender aos seus objetivos. E a dimensão do pragmatismo, onde se tenta neutralizar Ciro Gomes e pavimentar a coligação com o PMDB. Todas elas se confundem no noticiário do fim de semana e nos amplos espaços que as revistas semanais deram à Dilma e à convenção.
No âmbito ideológico, o debate se deu em torno de posições do aumento da presença do estado na economia, do apoio às propostas do Plano Nacional de Direitos Humanos e, ainda, à revisão dos mecanismos de propriedade e funcionamento dos veículos de comunicação. As propostas colocadas – e aprovadas na convenção – integram um repertório antigo e conhecido de intenções do PT que sempre foram mais "peças de retórica" do que propriamente planos de governo. Daí o ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, ter amenizado o impacto das mudanças promovidas nas diretrizes aprovadas na véspera pelo 4º Congresso Nacional do PT.
Outro exemplo do discurso ideológico é a afirmação de André Singer, ex-porta-voz de Lula, de que o PT não deveria buscar o PMDB como parceiro eleitoral. Posição registrada, mas de pouco impacto nas decisões da cúpula. O PT vai com o PMDB pelo simples fato de que é a melhor estrutura política disponível para se ganhar a eleição. No entanto, é uma aliança complicada como qualquer tipo de acordo que envolvem estruturas complexas como o PT e o PMDB. Em uma declaração pragmática, Lula disse que um governo bem sucedido elege o sucessor. Para tal, acertar os detalhes de uma coalizão com o PMDB e acomodar o PSB são essenciais para o sucesso da empreitada. O PMDB entra com o tempo de televisão e alguns palanques importantes. Mas, o seu grande valor é o de não coligar-se com José Serra.
Mais um exemplo das dimensões do discurso está na questão do papel do Estado. O PT defende o aumento do Estado. Não há nenhuma novidade nisso. A maioria do PT é adepta de soluções estatizantes e de maior intervenção. Após o crash de 2008, a posição de maior intervencionismo estatal na economia ganhou força. Novamente, o embate entre a intenção e o pragmatismo se apresenta. Tendo o intervencionismo como vocação da política nacional, é difícil esperar que seu fortalecimento enfrente resistências sérias. Mas, o que deve prevalecer, como fruto do pragmatismo, é a manutenção do tripé estado-capital nacional – capital estrangeiro, que funciona há décadas no país.
Todos aqueles mais esclarecidos no PT sabem que a estabilidade econômica e aspectos como a lei de responsabilidade fiscal, metas de inflação e câmbio flutuante foram heranças de FHC que fizeram a diferença a favor de Lula. Pragmaticamente, um governo Dilma manterá tais fundamentos protegidos. Refletindo sobre a extensão e influência do discurso partidário em um eventual governo Dilma, é importante entender que muitas das posições da convenção do PT foram acordadas visando pacificar o partido frente ao desafio das eleições. O desafio é saber o que sobreviverá ao embate eleitoral e ao pragmatismo necessário para se governar com sucesso.