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Mensalão e Realidade

Uma das situações mais extravagantes do processo eleitoral recente foi a expectativa de que o julgamento do mensalão pudesse afetar de forma significativa o desempenho do PT nas eleições municipais.

 

Muitos apostaram que a cobertura jornalística intensiva seria suficiente para paralisar o partido e, sobretudo, o papel de Lula na campanha.

 

Para mim, não houve novidade. No início do julgamento, em entrevista ao Globo News Painel, afirmei que não acreditava que o mensalão pudesse produzir repercussão importante entre o eleitorado.

 

Três meses e horas e horas de noticiário depois sobre o mensalão, nem Dilma nem Lula foram abalados com o resultado do julgamento. Ao contrário, a despeito das interpretações conflitantes sobre quem venceu as eleições, o PT foi o partido que mais obteve votos no primeiro turno.

 

Levantamento da Arko Advice indica que o PT foi a legenda que mais conquistou votos no 1º turno das eleições municipais para prefeito em todo o país (16,8% do eleitorado nacional), seguida por PMDB (16,2%), PSDB (13,5%), PSB (8,4%), PSD (5,7%) e DEM (4,4%). Sem falar no inquestionável sucesso em São Paulo.

 

Qual a razão do descolamento entre a chamada “opinião pública” e o eleitorado? Por que, no final das contas, o PT não foi penalizado politicamente pelo julgamento do mensalão?

 

Tenho algumas pistas. A primeira delas é o fato de que a imprensa escrita no Brasil é pouco relevante em termos numéricos. O impacto dos jornalões na realidade é pequeno. Sequer tiramos 7 milhões de exemplares de jornais por dia. Em sua maioria, jornais de baixa qualidade editorial.

 

O segundo aspecto é que a informação é adquirida pela televisão, que é, predominantemente, de recreio. O noticiário, em que pese sua enorme audiência, é uma revista genérica que cola uma sequência de notícias variadas. Que vão, rapidamente, de acidentes de trânsito a atentados no Iraque, passando por inundações nos Estados Unidos, pela violência em alguma cidade brasileira e pela situação do comércio. Não sendo palco de debates nem de formação de opinião crítica, o noticiário é tratado como “fast food” e consumido como tal.

 

O terceiro aspecto reside no fato de o brasileiro estar satisfeito com o Brasil e não desejar ser acordado desta situação por conta de ocorrências obscurecidas pelo passar dos tempos.

 

Para agravar as coisas, a noção acerca das instituições e de seus papéis é precária. Pesquisa indicou que apenas 4% dos brasileiros sabem para que serve o Supremo Tribunal Federal. Provavelmente, após o julgamento que transformou Joaquim Barbosa em herói nacional das elites, o conhecimento sobre o que faz o STF vai aumentar. Um pouco.

 

Assim, fazer o exercício mental de que alguns fatos ocorridos há mais de sete anos, envolvendo políticos e vários partidos, agora vão ser julgados é muito cansativo. Em especial para um eleitorado não politizado, pouco interessado, precariamente informado e satisfeito com o cenário econômico.

 

Não faço um julgamento ético do comportamento do eleitorado diante dos episódios julgados no mensalão. Apenas constato um fenômeno que deveria levar a uma ampla reflexão sobre o que o brasileiro realmente quer e pensa sobre o seu país e como parte expressiva da imprensa está deslocada dessa realidade.