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Desafios imediatos de primeiro grau

Por Murillo de Aragão
Publicado no Estadão – 05/05/2016
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Nas próximas semanas, salvo acidentes de percurso de gravidade excepcional, o vice-presidente Michel Temer assumirá a Presidência da República, nos termos da letra constitucional. E não há que falar em golpe contra a democracia, uma vez que, além das evidências robustas de “pedaladas fiscais” e de “contabilidade criativa”, houve uma estonteante manifestação de apoio ao processo de impeachment na Câmara dos Deputados. A admissibilidade na comissão especial do Senado deverá ser aprovada e em plenário, também.
O que acontecerá mais adiante? De um lado, Dilma Rousseff e os órfãos do “lulismo” encastelados no Palácio do Alvorada tentarão sabotar o governo Temer. As sabotagens virão de quatro formas: por meio da mobilização de setores dos movimentos sociais, da guerrilha jurídica no Supremo Tribunal Federal (STF), da grita internacional contra o “golpe” e do corpo a corpo com os senadores. Não deve dar certo. O governo Dilma Rousseff se esfacela sob o peso de seus erros e de sua grave desinteligência política.
De outro lado, Temer terá de enfrentar tanto o desafio da crise legada por Dilma quanto as sabotagens mencionadas. Para isso só existe um caminho: assumir com uma agenda de impacto para buscar a credibilidade fiscal perdida e animar os agentes econômicos, que, em primeira instância, são os geradores de emprego e renda no País. É certo que Temer adotará medidas como corte de despesa, redução de ministérios e demissão de cargos de confiança, além de propor uma reforma previdenciária e, quem sabe, a venda da carteira de empréstimos do BNDES, o que reduziria imediatamente a dívida pública. Outras opções são a escolha de executivos de ponta para as empresas estatais, teto de despesas atreladas ao PIB e fim das vinculações orçamentárias, autonomia do Banco Central e criação da autoridade fiscal independente, entre outras iniciativas.
No período entre a admissibilidade e o julgamento do impeachment, o governo Temer desvendará outras vertentes da “contabilidade criativa” que predominou nos últimos meses e poderá revelar à Nação que o Brasil está quebrado. Provavelmente, sem a adoção de medidas extremas não haverá dinheiro para pagar ao funcionalismo público federal no fim do ano. Verdade ou não, o fato é que a crença de que faltará dinheiro para o pagamento da folha de pessoal já está consolidada entre a burocracia que cuida do Orçamento da União. A situação dos bancos estatais, em especial Caixa Econômica, causará imensa apreensão. A nova equipe econômica terá um enorme susto em alguns dias.
Outro imenso desafio será manter a maioria da base de apoio ao impeachment na Câmara no day after da confirmação de seu governo de transição. Foram 367 deputados a favor. É, porém, razoável acreditar que essa base possa encolher. Mas será preciso aglutinar os votos em torno de agregados com lideranças claramente identificadas. O ponto de partida seria a coalizão altamente fragmentada composta por uma miríade de partidos (PMDB, PSDB, DEM, PSB, PSD, PP, PR, PRB, PPS, PTB, SD, etc.), que poderá dar cerca de 325 votos firmes num universo de 513 para aprovar a agenda de saída da crise.
Além de construir uma coalizão operacionalmente eficiente, o novo governo ainda terá de buscar criar um Ministério com credibilidade e força política. Não adianta um Ministério de notáveis sem voto ou um Ministério de medíocres cujo valor seja o de apenas aportar votos na Câmara e no Senado. Reside aí o dilema central do governo Temer: construir um Ministério politicamente forte e socialmente acreditável. Como fazê-lo? No papel é razoavelmente simples, basta dividir os prováveis 24 ministérios que sobraram dos atuais 32 em quatro grupos: o núcleo político, o núcleo econômico, o núcleo estratégico e as demais pastas. Difícil é conciliar o desejo dos aliados por cargos com as exigências de um novo tempo, de um novo governo, e numa época em que a cidadania clama por uma nova política.
Como desafio suplementar, mas não menos relevante, Temer precisa construir um sólido núcleo jurídico no Ministério da Justiça, na AGU e na CGU, visando a dar estabilidade e transparência ao governo no andamento da Operação Lava Jato, que deve prosseguir com ampla liberdade institucional e dentro do marco jurídico e constitucional do País. A cidadania que apoiou amplamente o processo de impeachment deseja que as investigações continuem dentro da normalidade e cheguem a seu termo sem truques nem obstáculos.
Quais as chances de o período pós-admissibilidade no Senado dar certo para o Brasil? Isso vai depender sobretudo de como Temer vai enfrentar os três desafios citados: restabelecer alguma credibilidade na economia, consolidar uma nova maioria e assegurar o bom andamento da Lava Jato. Saindo-se razoavelmente bem nesses pontos, a situação será pacificada e nem mesmo a resistência de Lula e Dilma será capaz de impedir a confirmação do impeachment e um novo recomeço para o Brasil. Dilma será definitivamente afastada do poder e irá, juntamente com Lula, entrar em campanha a favor das eleições gerais, mantendo viva a narrativa do golpe.
O desafio seguinte será o de caracterizar o governo Temer como um processo de transição destinado a fazer o País chegar a 2018 em melhores condições econômicas. Até lá, depois de enfrentar os desafios econômicos e de governabilidade política, Temer deveria empenhar-se em propor e liderar uma ampla reforma institucional para atacar questões partidárias, eleitorais, federativa e de relacionamento entre os Poderes. Outros temas são a simplificação do sistema tributário, o fortalecimento dos acordos entre patrões e empregados na esfera trabalhista e uma radical desburocratização do investimento. Talvez não dê tempo. Mas não custa desejar.