O governo fez muito bem em leiloar as concessões e atrair empresas privadas para gerir os aeroportos. Não sem tempo, já que a Infraero, em que pesem suas realizações, não conseguiu acompanhar os novos tempos. O resultado financeiro da empreitada (serão pagos R$ 24,5 bilhões pelas concessões) foi muito bom e espera-se que os vencedores cumpram as cláusulas acordadas e ofereçam um bom serviço aos usuários.
Vencida a questão da necessidade, examinemos agora o debate político em torno do tema, que foi incorporado por setores da imprensa. Contudo, apesar dos aspectos relevantes da iniciativa, temos instalada uma discussão estéril e inútil.
Acusar o PT de seguir a receita do PSDB não é lá grande coisa. No mínimo, revela falta de imaginação e de profundidade. Privatizou-se e concedeu-se em todos os governos, desde o tempo de Sarney. E tais práticas foram intensificadas com Collor.
Itamar Franco, mesmo sendo contra o processo, deu prosseguimento a ele. FHC, como esperado, o aprofundou, e Lula, a seu modo, também deu continuidade. Vale lembrar que, na era FHC, Antonio Palocci, então prefeito de Ribeirão Preto, privatizou – sem o apoio do PSDB – a companhia telefônica do município.
Lula, apesar do discurso adotado, fez concessões de rodovias e de usinas hidrelétricas. Dilma, ao leiloar as concessões dos aeroportos, dá a resposta adequada à demanda de fazer crescer o investimento no setor a fim de aumentar sua eficiência.
Como vemos, as soluções de privatizar e de leiloar concessões não são novas. Estão integradas à paisagem de nossas políticas públicas há muito tempo. Daí ser meio ridículo gastar tanto tempo com o assunto, como se o governo do PT nunca tivesse promovido ações como esta.
Na política, ser contra ou a favor muitas vezes é decidido meramente em função da relação que se mantém com o governo. Pode não ser uma atitude sincera, mas faz parte do jogo. Entretanto, não deve ser a tônica do noticiário.
Conforme colocado no atual debate, fica parecendo que o PSDB é o campeão “neoliberal”, e o PT, o “social-democrata” enrustido que implementa políticas neoliberais. Ambas as impressões são bastante imprecisas.
Que os partidos politizem a discussão é mais do que esperado. Ao torcer argumentos e perspectivas, visam ganhar poder frente ao adversário. Fernando Henrique Cardoso afirmou em entrevista que a concessão de aeroportos acaba com os “fantasmas” das privatizações. O ex-ministro da Casa Civil José Dirceu escreveu artigo no Jornal Brasil Econômico elogiando o leilão dos aeroportos e classificando-o como concessão, não como privatização. Ressaltou o alto valor pago pelos participantes, o que, segundo ele, refletiu o interesse de se investir no país.
Porém, a grande imprensa não deve entrar nessa politização, sob pena de desinformar e não esclarecer. E informar é, sem dúvida, o seu papel.
Sendo assim, a imprensa deve repor a questão e o debate em seus devidos lugares e mostrar a intenção de cada ator nesse cenário. Tanto no que se refere ao discurso que visa atingir o adversário quanto no que diz respeito à natureza das decisões adotadas pelo governo.
Mesmo com forte intervenção estatal na economia, concessões de serviços públicos fazem parte da nossa história. O ideal é tentar mostrar que o caminho trilhado segue uma tendência que não foi inventada pelo PSDB nem abandonada pelo PT.
Até porque, nesta altura da humanidade, vivemos a pós-modernidade, período em que as soluções decorrem muito mais de reflexão do que de imposição rígida de padrões ideológicos.
Enfim, o espaço para “ideologizar” as notícias sobre o episódio deve se limitar aos editoriais e não se estender ao noticiário.