O Brasil começava o ano satisfeito, com prognósticos de crescimento. Então, a pandemia de coronavírus, tal qual um cisne negro que surge do nada, destruiu as expectativas. Em meio a nossos prosaicos e provincianos problemas, a maioria deles do século passado, o mundo jogou sobre nós um desafio de imensas proporções. Lamentavelmente, até bem pouco tempo atrás, essa questão não era tratada com a necessária seriedade. Quando o surto da doença emergiu, em janeiro, aqui mesmo nestas páginas, antecipei o gigantesco desafio que seria enfrentá-lo. Afirmei que as boas perspectivas econômicas para 2020 tinham de ser revistas. Mas não houve, infelizmente, o devido engajamento da sociedade e do governo para evitar que a chegada da Covid-19 fosse amenizada.
De certa forma, nenhuma medida significativa foi tomada até bem depois do Carnaval. O Brasil oficial estava mais preocupado com disputas orçamentárias do que com a ameaça de uma pandemia. Apenas quando a longa mão da peste atingiu os escalões oficiais o tema, enfim, mudou de patamar. Enquanto o Brasil ruminava mover o gasto público para destravar o crescimento, a economia americana, a mais liberal do mundo e profundamente endividada, abria os cofres para evitar uma recessão. Lembrando que nos Estados Unidos existe apenas cerca de 4% de desempregados.
“A lição que o governo americano sempre dá é abrir os cofres públicos para a economia não parar”
A lição que o governo americano sempre dá nos momentos de crise é abrir os cofres públicos para não deixar a economia parar. Para o Brasil a crise do coronavírus é, potencialmente, mais intensa do que o 11 de Setembro de 2001 e a crise de Wall Street de 2008.
As respostas que o setor público tem de dar ao desafio do coronavírus devem ultrapassar, em muito, os 147 bilhões de reais anunciados no início da semana passada. A declaração de calamidade pública é apenas mais um passo. A liberação de recursos para os aposentados e os mais vulneráveis é paliativa. Precisamos irrigar a economia com crédito e dar tempo ao contribuinte para pagar taxas e impostos, bem como realizar a compra de equipamentos médicos e remédios, numa escala nunca vista no país. Mas, sobretudo, é necessário ter liderança. O presidente da República tem de conduzir o combate à epidemia junto com os governadores, e estes com os prefeitos. O interesse da coletividade deve prevalecer sobre as picuinhas políticas. O diálogo entre as esferas dos poderes precisa ser imediato e efetivo. O Judiciário e o Legislativo devem dar respaldo às medidas a ser implementadas de forma ágil pelo Executivo. Recentemente, em uma boa iniciativa, resolveram criar uma espécie de fast track para remover entraves burocráticos à compra de equipamentos e remédios. O STF precisa dar garantia às decisões emergenciais que serão adotadas.
Para Bolsonaro, seu destino como presidente pode estar sendo decidido pela forma como combate esta pandemia, sob pena de perder popularidade e capacidade de comandar em um momento grave da nação. Como dizem os pilotos de Fórmula 1, as curvas e o uso dos freios separam os homens dos meninos. Na política, a crise joga no limbo os incapazes e exalta os competentes. É hora de as lideranças de direito demonstrarem que são lideranças de fato.