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Complexidade e imprevisibilidade

Muitos anos depois, por conta dos filhos e dos sobrinhos que a vida nos traz, vou a Disney, em Orlando. é uma experiência incrível: o encontro entre as classes C e D dos Estados Unidos e uma massa de estrangeiros.

Dois pontos unem a todos: a magia e a organização do lugar. A cada x minutos, o barquinho do Piratas do Caribe faz o seu passeio desde que eu tinha 15 anos! A Disney e o Brasil também têm pontos em comum: complexidade e encanto. Mas no que tange à organização, vamos muito mal.

Me impressiona andar anos após anos pela Florida Turnpike e o asfalto se manter igual há décadas, sem remendos nem buracos. O mesmo se pode dizer da I-95, outra estrada dos Estados Unidos. Os jardins e canteiros públicos são limpos e bem cuidados, como se fossem novos. Anualmente, os governos estaduais e federal gastam bilhões de reais em recuperação de estradas que, muito frequentemente, se deterioram em uma velocidade impressionante.

Outro dia, uma diretora de uma multinacional disse que seus diretores norte-americanos não entendem como o Brasil consegue crescer em um ambiente de desorganização, complexidade e imprevisibilidade. Para eles, o melhor dos mundos é aquele onde tudo é organizado, previsível e fácil de ser apreendido. Não é o nosso caso. “No Brasil, até o passado é incerto”. Esta frase é atribuída ao ex-ministro da Fazenda Pedro Malan (governo Fernando Henrique Cardoso), que costumava citá-la para se referir à dificuldade de gerir a política fiscal quando novas e elevadas despesas são criadas por decisões judiciais relativas a acontecimentos no passado.

Matéria da revista Piauí com o cineasta Fernando Meirelles sobre fazer cinema no Brasil e nos Estados Unidos revela exatamente essas diferenças. Cidade de Deus (filme de 2002) foi produzido à brasileira: um processo conturbado em que o diretor tinha controle absoluto sobre tudo. Nos Estados Unidos, o diretor é subordinado aos produtores. Meirelles conta que lá você tem de filmar todos os dias e mandar o material para eles (os produtores) opinarem.

A previsibilidade desejada pelos norte-americanos nos sufoca. Somos movidos pela “eventologia”, que significa mirar um objetivo e chegar lá. Sabe Deus como! é o caso do Carnaval, que, em sua aparência caótica, produz ordem, deslumbramento e encantamento. Ainda que por poucas horas.

Seria impossível fazer do Carnaval uma Disney, que abre e fecha apresentando as mesmas coisas a tempo e a hora, anos após ano. Não temos organização para tanto. Nem o Carnaval pode ser escravizado em uma estrutura tão enquadrada.

Curiosamente, o fato de termos a cultura dos eventos pode resultar em sucesso nos megaeventos que se aproximam (Copa do Mundo de 2014 e Jogos Olímpicos de 2016). Por outro lado, quando a rotina voltar à normalidade, o asfalto continuará esburacado, as praças sujas e os serviços públicos precários.

Após os megaeventos que serão realizados no Brasil, o ideal é que ocorresse a quebra do círculo vicioso em que vivemos: desprezo às rotinas e exaltação aos eventos. O que, na prática, significa que devemos ser mais organizados para podermos elevar a qualidade de nossas rotinas. Sem deixar de lado a espontaneidade e o improviso que permeiam nossas soluções. Não é fácil.

A chave de nosso sucesso como nação vai estar na capacidade de unir improviso, criatividade, rotina, consistência e organização. Será um imenso desafio, pois demanda que a motivação esteja muito elevada sempre e que não caiamos na tentação de deixarmos para o amanhã o que podemos fazer bem hoje. Vencida essa barreira cultural, o céu será o limite para o sucesso do Brasil.