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A fórmula Lula de desenvolvimento

O texto a seguir analisa aspectos da política econômica de Lula no segundo mandato:



No papel de ministro da Fazenda de facto, Lula está dando as cartas. Após recolher sugestões de vários ministros, tomou algumas decisões de caráter econômico mesmo contra a opinião de setores do ministério da Fazenda.



As medidas visam aumentar o gasto público voltado para investimentos na área de infra-estrutura. São elas:



Saneamento Básico aumento dos investimentos do setor, por meio das seguintes medidas: a) injeção de recursos na Caixa Econômica Federal pelo Tesouro Nacional ou ampliação do limite de seu patrimônio para emprestar ao setor público (hoje no teto de 45%); b) mudança das regras pelo CMN para poder ampliar o nível de endividamento de estados e municípios, respeitando a LRF; c) liberação de recursos pelo BNDES para obras de saneamento básico; e d) aplicação de recursos do FGTS e dos fundos de pensão das estatais em fundos de infra-estrutura.



Energia aumento dos investimentos e participações da Eletrobrás no setor elétrico, retirando a estatal do cálculo do superávit primário, a exemplo do que ocorreu com a Petrobrás em 2001.



Mais do que analisar as propostas, cabe fazer uma avaliação política das decisões do presidente.



A primeira mensagem é a de que a equipe econômica perde espaço na formulação das políticas públicas de crescimento. Consultando a todos de sua equipe para que apresentem sugestões para destravar o Brasil, Lula rebaixa a equipe econômica que sempre teve predominância na formulação e na decisão da política.



Caracteriza um encurtamento do espectro ideológico do time, diferentemente do primeiro mandato, quando Lula atuava de acordo com a cartilha de Palocci. No entanto, este novo comportamento era esperado e não significa nada de novo.



A segunda mensagem é o fato de que alguns nomes ganham importância no debate econômico: Paulo Bernardo (Planejamento) e Márcio Fortes (Cidades), por exemplo. Mantega continua, evidentemente, relevante, mas perde espaço. Aliás, reconhecendo que exagerou na dose quando externou sua insatisfação com propostas iniciais apresentadas por Mantega para estimular a economia (disse que o pacote inicial não estava bom e queria mais ousadia), Lula deixou que Mantega anunciasse sozinho na semana passada o pacote de estímulo ao setor de habitação.



A terceira mensagem é a de que o BC, e em especial Henrique Meirelles, estariam marginalizados do debate. Talvez sim, talvez não. O é certo que o BC passa a ter posição de menor destaque. Para o mercado, significa que a blindagem do BC tornou-se vulnerável.



Quarta mensagem: os estados vão ganhar um refresco. Porém, os sinais são contraditórios. Acena-se com alívio no pagamento da dívida e ao mesmo afirma-se que a Lei de Responsabilidade Fiscal não será descumprida ou modificada. Como isso vai funcionar? Estados endividados vão ganhar crédito extra? Subsídios? Ampliação dos fundos de combate à pobreza e de compensação às exportações?



A quinta mensagem refere-se ao superávit primário. Assegura-se que a ampliação dos gastos, via capitalização das empresas estatais, entre outras medidas, não vai afetar a meta de 4,25% de superávit primário. Como equacionar o aumento dos gastos e a manutenção do superávit primário? Tudo indica que por meio da manutenção ou ampliação da carga tributária.



Ao selar compromisso com o PMDB, Lula afirmou que vai trabalhar para a queda do gasto público e da carga tributária. Como compatibilizar o discurso de crescer com gasto público e cortar impostos? A Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas, recém aprovada no Congresso, apesar de uma renúncia fiscal de R$ 5 bilhões de reais por ano, é um bom começo. O problema é muito mais grave. A queda da relação PIB/Impostos, hoje na casa dos 38%, deveria ser mais intensa. A única maneira de consegui-la é cortar gastos. Lula sinaliza na direção oposta.



A sexta mensagem é a seguinte: o Estado é o ponto central do país e não a sociedade. O governo esperava que a iniciativa privada acordasse para os investimentos. Como não acordou, a contragosto o governo o fará. O raciocínio é de um oportunismo bárbaro. Ao invés ampliar as garantias jurídicas para os investimentos, avançar na modernização da legislação trabalhista, fortalecer de verdade o marco regulatório, o governo acusa o setor privado de dorminhoco e avança no investimento público.



O viés do governo está errado. Lula também deveria chamar o setor privado, apresentar o cardápio de necessidades, explicitar o apoio do governo aos projetos e informar-se sobre o que os empresários precisam para investir e trabalhar em uma agenda comum. É preciso fazer isso e não apenas pedir aos ministros que apresentem soluções para investir mais dinheiro público. 


A sétima mensagem está na decodificação do papel central de Lula e o formato do segundo mandato. O modelo do primeiro mandato era tripartite: Palocci na economia; Dirceu na política e Lula na frente do palco. Lula era o cantor. Palocci e Dirceu eram os maestros. Agora, Lula assumiu o papel de maestro e cantor. Rege as orquestras política e econômica e aparece na frente do palco.



Enquanto funciona, tudo bem. “Lula colhe diretamente os louros da vitória e não tem que dividir o sucesso com paloccis e dirceus. Não tem que ficar constrangido vendo as capas das revistas a respeito dos homens fortes do governo. Ou as matérias que diriam que se o Palocci de plantão sair, o mercado vai ficar nervoso.



Se não funcionar, Lula pode pagar um preço alto pelo insucesso. Não vai ter com quem dividir o fracasso. Dando errado, vai ter que voltar ao modelo antigo. Terá que chamar um salvador da pátria para recuperar o governo. Imaginem, pode ser como no segundo mandato de FHC, onde o salvador foi Armínio Fraga e sua equipe.



A interpretação das mensagens revela aspectos contraditórios. A ocorrência do crescimento econômico ao nível esperado (cerca de 5%) é possível na medida em que o governo seja competente na organização dos esforços que anuncia. As PPPs andam a passos de tartaruga. Caso a eficiência seja a mesma das PPPs, as metas podem fracassar. Não por falta de dinheiro. Por falta de competência.