Um dos temas do momento é a fragilidade das oposições. Divididas e sem discurso, só lhes restam a questão moral para atacar o governo. Como ninguém se importa e nunca houve uma prova cabal de envolvimento direto do presidente, as coisas foram sendo assimiladas pelo sistema hepatológico do eleitor. Vencida a etapa eleitoral, o acirramento do discurso depende do surgimento de fato novo. Assim mesmo, tem que ser um fato novo de proporções cataclísmicas. O governo, vendo o desespero da oposição age com prudência e vai sufocando-a com maestria. Tomou-lhe a verba. Toma-lhe o verbo. Ainda assim, acena seletivamente para algum diálogo. Para ser completa a tragédia oposicionista, Lula teria que ter um candidato a altura do seu tamanho para sucedê-lo. Ele mesmo ou outro. Dada às implicações constitucionais e à pobreza de nomes no PT, Lula não tem candidato. É uma bóia para a oposição flutuando em meio às procelas da política nacional.
Além de ter candidato ou melhor, candidatos, até agora a oposição somente conta com o acaso. Aquele que sempre dá as caras. Afinal, mesmo considerando que a cota de trapalhadas promovidas pelos aliados aloprados do presidente parece esgotada, nunca se sabe. Na eleição, o acaso apareceu de forma aguda nas crises das sanguessugas e da operação Cuiabá. Lula derrotou Alckmin e o acaso também. Será que o candidato de Lula teria tal capacidade? No entanto, depender do acaso e do erro do adversário é muito pouco. A oposição tem que construir um discurso. Não é fácil, como veremos a seguir. Sem discurso, a oposição está como o cachorro que caiu do caminhão de mudanças. Ninguém mora mais na casa antiga e ele não sabe o endereço da casa nova. Está sem rumo. Os partidos de oposição, em meio à crise de discurso e de identidade, vagamente, apontam para uma refundação de suas respectivas estruturas partidárias.
O caminho de retorno desses partidos ao poder é longo e cheio de armadilhas. Sem um reconhecimento de suas identidades, ambos vão terminar sendo o que é o PP (ex-PDS, ex-Arena): partido sem identidade e sem propósito. Além da questão programática de que deve ser valorizada, existem temas que estão abandonados e podem ajudar a construção de um novo discurso: as reformas constitucionais. Não há quem defenda, por exemplo, a reforma da legislação trabalhista, um monstrengo que impede a formalização de mais da metade dos trabalhadores ativos do Brasil. O medo da punição das corporações sindicais apequena os políticos. Ninguém quer ser tachado de traidor dos trabalhadores em cartazes afixados pela CUT. Resta saber quem traí, de verdade, os interesses dos que trabalham. O fato é que os partidos de oposição não têm coragem de rever suas atitudes nem de atacar os privilégios.
Outro ponto crítico da realidade nacional é que está abandonado no debate político é a questão do papel central do Estado no Brasil e o caráter subalterno da sociedade. Como também se beneficiam dessa situação quando no poder, silenciam. Ao invés de combater o privilégio das corporações e a predominância do Estado, tanto o PFL quanto o PSDB também, como os demais partidos, adoram uma boquinha nos cofres públicos. Adoram poços do DNOCS. Verbas partidárias. Emendas orçamentárias. Jetons. Gostam de intervenção na economia, de carga tributária elevada, de tabelamento de preços de verbas públicas e de pudê (poder). Em doses variadas e dependendo da região. Mas gostam. Por medo e/ou por conveniência, encurtam e empobrecem seus discursos.
Lula tomou a prática política e o o discurso do PSDB-PFL. Aprofundou o ciclo social-democrata instalado com Sarney (Plano Cruzado, Programa do Leite, Mutirão de Casas) e intensificado por Itamar e FHC. Manteve as conquistas do Plano Real de FHC protegidas e aprofundou as iniciativas sociais conhecidas como a Rede de Proteção Social. Foi fácil para Lula. Fácil como tirar pirulito de criança. Sem os escândalos e trapalhadas de seus aliados aloprados, Lula teria vencido no primeiro turno com mais de 80% de aprovação. Brasileiro é, além de bonzinho, baratinho: se contenta com um benefício agora do que uma mudança estrutural e qualitativa adiante. A falta de uma oposição ideológica empobrece o Brasil e permite que o estado de coisas centralidade do estado, corporativismo, gasto público excessivo e ineficiente, carga tributária, etc. se perpetue. E, ainda, cause um outro fenômeno: o super povoamento do centro na política nacional. Para o bem e para o mal. Porém, isso é tema para um artigo futuro.