Murillo de Aragão
Há 50 anos (maio de 1959), Fidel Castro estava no Brasil, em visita oficial. às nove da manhã, segundo O Globo, Castro já se encontrava no Batalhão de Guardas, onde foi a convite especial do ministro da Guerra, marechal Teixeira Lott. Vejam bem, a convite especial de Lott. Outros tempos! O almoço foi com o presidente JK e o vice João Goulart, entre outras autoridades. Um vatapá liderou o cardápio da reunião. Depois, por conta da diplomacia, JK fumou – pela primeira vez na vida – um charuto oferecido por Castro. A passagem de líder cubano pelo Brasil despertou muita atenção.
A tarde, Fidel fez um discurso para estudantes da UnB. Falou pouco: duas horas e dez minutos! De acordo com O Globo, os pontos mais importantes do discurso foram: 1) é mais difícil governar, depois da revolução, do que fazer a própria revolução; 2) dividida, a América Latina nada é, ao passo que unida poderá transformar-se em uma grande força; 3) para realizar o desenvolvimento industrial é indispensável realizar antes a reforma agrária; 4) somos, os latino-americanos, a raça mais pura do mundo, porque não nos preocupamos com problemas de raça; 5) o Brasil deverá exercer papel preponderante no futuro da América Latina; 6) Brasília não será somente a futura capital do Brasil, mas a capital do continente. Castro estava no seu melhor momento e seu discurso teve aspectos visionários.
A começar pelas dificuldades de governar. Apesar de alguns avanços, Cuba foi mal governada. Resolveu mal aspectos básicos às custas dos direitos humanos e de graves restrições à liberdade. Não devemos aceitar uma troca nesse campo. O segundo aspecto está na união da America Latina. Ponto para Castro. Mesmo assim, Cuba trabalhou contra essa união em muitos momentos, fomentando guerrilhas e discórdias. Ao abordar a questão da reforma agrária, ele não foi nem visionário nem conservador. A questão era evidente e não foi adequadamente encaminhada no Brasil.
Quarto aspecto apontado: a questão racial. O curioso raciocínio de Castro indicava que a mistura fazia dos latino-americanos a raça mais pura do mundo. é um pensamento torto. No entanto, não deixa de ser uma forma criativa de pregar a igualdade racial. Castro afirmou que o Brasil iria exercer papel preponderante na América dos Sul e Brasília tornar-se a capital do continente. Via na construção de Brasília um movimento que ia além da interiorização do Brasil. Significava uma também uma mirada para os nossos vizinhos. 50 anos depois, o discurso de Castro ainda é atual. E ele era, sem dúvida, “o cara” mais inspirador daquela época. Uma espécie de Obama. Pena que estava certíssimo ao falar das dificuldades de governar. Nesse sentido, o impacto de JK para os brasileiros foi mais importante, enquanto Castro envelheceu, o comunismo acabou e Cuba ficou sem lugar no mundo.
Os cinco anos de JK valeram mais do que os 50 anos de Castro. Pelas seguintes razão: 1) ao criar Brasília marcou uma profunda transformação cultural do Brasil e do Brasil em relação aos seus vizinhos; 2) Soube ser democrático e magnânimo ao lidar com as tentativas de golpes; 3) mobilizou todas as classes em favor de um projeto de país sem ter que fuzilar adversários; 4) deixou exemplos que inspiraram quase todos os presidentes subseqüentes. Em especial, Itamar, FHC e Lula; 5) deixou um legado de simpatia e diálogo que está entranhando em nossa sociedade. Com seus cinco anos que valeram 50, JK foi um dos maiores estadistas do século passado.