Tempos atrás, ainda este ano e antes das manifestações que demoliram a popularidade dos políticos, escrevi que o governo Dilma Rousseff colocava o seu imenso favoritismo para 2014 em xeque. Na ocasião, Dilma tinha mais de 60% da preferência eleitoral na corrida presidencial e as percepções de fracasso na economia ainda não haviam se cristalizado.
Ao final do artigo, eu concluía dizendo que o maior adversário de Dilma é seu próprio governo e seu estilo de gestão. Sobretudo a incapacidade de transformar sucesso econômico e popularidade em poder político.
Era uma situação que defini como de fracasso assintomático. O artigo foi escrito em fevereiro deste ano e publicado no Brasil Econômico. Pois bem, de lá para cá, passaram-se alguns meses. E o que era assintomático transformou-se em fracasso evidente.
Os cinco problemas que apontei no início do ano somente se agravaram. A rigor, os problemas já existiam antes das manifestações de junho. De fevereiro para cá, tudo piorou.
A relação do Planalto com o mercado financeiro nunca esteve tão ruim desde o início da era Lula. A confiança do empresariado no governo está em baixa histórica. O apoio sindical ao governo está rachado como nunca antes. O diálogo com os movimentos sociais é precário, assim como o diálogo com o mundo político.
Quando o prestígio de Dilma despencou, Lula teria recomendado que ela promovesse diálogos semanais com seu conselho político. A iniciativa foi retomada, mas logo as reuniões deixaram de se realizar.
A intolerância e a inabilidade política do governo estão conseguindo transformar em realidade duas velhas aspirações do Congresso que o Executivo sempre quis evitar: a iminente aprovação do Orçamento Impositivo e a rápida votação dos vetos presidenciais. O Orçamento Impositivo foi aprovado pela Câmara com ampla margem de votos e agora está sob análise do Senado. Os vetos presidenciais serão analisados todo mês pelo Congresso Nacional. Já houve reunião dos congressistas em agosto e a próxima acontece no dia 17 de setembro.
Para piorar, em que pese a honestidade da presidente, o governo fraqueja em evitar escândalos graves e negociatas que ocorrem – nas barbas do Ministério Público – dentro dos ministérios e das empresas estatais. A famosa faxina do início do mandato deixou de prosseguir.
Paradoxalmente, Dilma continua favorita. Seus erros e inconsistências, apesar de tudo, ainda não a retiraram dessa condição. Contribui para isso o caráter amador-juvenil de nossas oposições. Como bem disse Elio Gaspari, “o PSDB tem mais ressentimentos do que planos e mais queixas do que projetos”. A presidente, conforme última pesquisa Ibope (15 e 18 de agosto), começa a recuperar parte da popularidade perdida. Os que avaliam o governo da presidente ótimo ou bom subiram de 31%, em julho, para 38% em agosto.
Outro aspecto paradoxal é o fato de que a receita testada e aprovada de Lula para criar consensos foi descaradamente abandonada para se estabelecer um jogo voluntarista de perde-perde.
Não ganha o governo, já que está cercado de dificuldades políticas. Não ganha a base política, por conta do relacionamento precário com o governo. Não ganha a sociedade civil, que perdeu espaços de negociação. Perde, sobretudo, a cidadania, que vê os poderes públicos claudicando justo quando temos, provavelmente, as melhores condições financeiras e fiscais da história econômica do país.
Ultimamente, Dilma resolveu se mexer e viajar pelo Brasil. Porém, não adianta só buscar a “foto do dia” na imprensa. Dilma deve cuidar daqueles que podem multiplicar as boas-novas do governo. A receita é simples: bastar ter vontade de ouvir e de conversar.
Murillo de Aragão é colunista semanal do jornal O Tempo e O Liberal, às terças-feiras.