Pode ser que não seja exatamente assim, mas a história do Pão de Açúcar com o grupo Casino parece aquela de quem está precisando de um sócio para alavancar e/ou sair de dificuldades. Consegue o sócio e, de repente, descobre que poderia ter feito tudo sem ele. Ou, ainda, que as expectativas se realizaram muito acima do previsto e que, no limite, o sócio conveniente de então virou um “encosto”.
Em sã consciência, poucos acreditavam que o Brasil teria uma explosão de consumo de forma tão consistente no governo Lula. Quando o Pão de Açúcar se associou ao grupo Casino, em 1999, o Brasil vinha de uma grave crise cambial e as expectativas no país eram incertas. Na sequência, vivemos um bom momento para, em seguida, atolar no “apagão”. Depois veio Lula e a história mudou.
Tempos atrás, as companhias nacionais corriam atrás de sócios estrangeiros. Eu mesmo, em duas ocasiões, negociei com dois grandes grupos de fora: um inglês e um americano. Não deu certo: eles queriam que eu me pagasse para vender a empresa para eles. O meu lucro seria no ponto futuro, caso ela fosse alavancada pelos novos sócios.
Pois bem, o Brasil de hoje não é o Brasil de dez anos atrás. O mundo de hoje é muito pior que o de dez anos atrás. Como o mundo foi rebaixado, o Brasil foi promovido para a primeira divisão. E, como tal, agora começaram a descobrir o que temos de interessante: um mercado interno ávido por consumo e uma infraestrutura para ser construída em todo o país. Temos um consumidor educado para o consumo e com um poder de compra crescente nas classes médias.
O Wal-Mart possui mais de 3.400 lojas nos Estados Unidos. Imaginem o que vai acontecer no Brasil, nos próximos dez anos, no segmento de supermercados? O mesmo vale para a aviação, que cresce de três a quatro vezes o valor do PIB. O horizonte para o consumo no Brasil é muito bom. Pão de Açúcar, Casino, Wal-Mart e Carrefour sabem muito bem disso.
é evidente que o Casino, que está solidamente plantado em um mercado estagnado – a Europa –, não vai abrir mão de seu futuro, que é o Brasil. Em 1999, quando o país patinava, eles vieram aqui e compraram parte do capital do Pão de Açúcar, que, na época, precisava de caixa e buscava sócios. Agora, quando tudo virou um conto de fadas, não vão abrir mão facilmente. Sócios no osso. Sócios no filé-mignon.
Não sei como vai terminar o imbróglio Pão de Açúcar-Casino. Porém, seria prudente recompor as relações e até mesmo o balanço de poder quando os franceses virarem majoritários. Comprar o Pão de Acúçar não significa que o grupo terá o mesmo sucesso de antes. O Brasil, apesar de promissor, é um mercado complexo em que a gestão empresarial demanda uma sofisticação cultural nada fácil de ser encontrada.
Por fim, não entendo o estranhamento com o papel do BNDES na questão. Caso a operação se concretizasse, ela seria muito boa para o país. O Brasil pode ser um player majoritário no mercado mundial de supermercados. Aliás, o Brasil deveria usar parte de suas reservas para comprar empresas mundo afora e expandir a internacionalização de nossos empreendimentos e investimentos.