No dia 6 de abril, acordei para ir ao Rio de Janeiro. Minha cidade natal. Tinha uma reunião no Jardim Botânico. Sabendo das chuvas do dia anterior, fui buscar mais informações. Aeroporto fechado e ruas alagadas me fizeram ficar em Brasília.
Acompanhando o noticiário, soube que era a pior chuva em 44 anos. ávido de notícias, acompanhei tudo o que foi publicado. Fiquei espiando as câmeras da prefeitura do Rio tal qual um Big Brother da vida real.
Adiante, lendo Bruno Medina, em seu blog, ele dizia que se tivesse 9, 10 anos, as últimas 24 horas no Rio de Janeiro “teriam representado uma aventura e tanto”.
Pois bem, logo me coloquei na pele do menino que fui nos anos 60. Morando em Copacabana, na Rua Barão de Ipanema, assisti ao maior temporal em décadas. Desabamentos, ruas alagadas e árvores tombadas.
Fui, com minha mãe, para o alto da Rua Santa Clara. Ela queria ajudar. Lá, a finada Rádio Continental cobria ao vivo o resgates de vítimas que moravam no morro no final da rua. Alguns cadáveres, os primeiros que vi na minha vida, foram colocados na banca de jornais da esquina. No caminho, enormes blocos de asfalto e buracos pela rua. Uma chuva sem fim.
Foi uma aventura. Uma triste aventura. Minha mãe resolveu ir para São Paulo. Fomos em um ônibus da Cometa. A viagem durou mais de 12 horas. Passamos pelo local onde um ônibus do Expresso Brasileiro tinha sido levado pela enchente. Jazia de rodas para o ar na beira de um rio. Outra aventura. Choveu durante todo o trajeto.
Hoje, de Brasília, onde também chove muito e quando chove forte, falta luz e as ruas também ficam alagadas, senti de perto uma pequena mostra da trágica situação do Rio.
Infelizmente, ano após anos, as enchentes vão e voltam. Bueiros entupidos, construções em lugares inadequados, sistema de alertas inexistentes e muito descaso contribuem para a repetição de problemas crônicos.
Imaginei se nevasse no Brasil. Existiriam caminhões com sal para derreter a neve? As ruas seriam limpas regularmente? Os sistemas de aquecimento funcionariam adequadamente? A cada inverno, quantos não morreriam por conta de nossa crônica inaptidão para prestar serviços públicos minimamente adequados?
Não apenas no Rio, Brasília e São Paulo. A ineficiência na gestão das cidades brasileiras é dramática, doentia e trágica. Em Brasília, muitas obras rodoviárias são feitas. Mas, os pontos de alagamento no Plano Piloto continuam os mesmos. Construir é bom. Cuidar é chato.
No Rio e em muitas capitais, a ocupação do solo é indiscriminada. Politicamente, não há coragem de se enfrentar a questão. Nem mesmo impedir as evidentes situações de risco existente em muitas favelas. Mais de 12 mi famílias viveriam em zonas de risco nas comunidades do Rio.
A questão urbana está mal posta em todos os sentidos no país: trânsito, saneamento, lixo, fornecimento de água, defesa civil, entre outros pontos. São temas periféricos no cardápio político nacional. Só ganham às manchetes quando a tragédia acontece. Infelizmente, não vai mudar.