O Tempo – 16/11/2016
Por Murillo de Aragão
Uma das características mais marcantes do PSDB é o choque de egos entre seus líderes maiores. Nos anos 1990, a disputa era entre os senadores Mário Covas e Fernando Henrique Cardoso. Covas não teria se conformado com a derrota na campanha para presidente da República em 1989. Contava com tempo generoso na TV Globo e com a simpatia do dr. Roberto, com quem buscaria inspiração para a ideia-síntese de seu discurso: “Choque de capitalismo”.
Cinco anos depois, FHC ganhou a corrida para o Planalto com sobra (54,28%) no primeiro turno. Um ano antes, os prognósticos diziam que ele não se reelegeria para o Senado, mas isso foi antes do Plano Real, em 1994, que derrubou a inflação mensal de 47,43% para 6,84%.
Até aí, além de Fernando Henrique, os então caciques do partido – José Serra, Tasso Jereissati, Covas e o próprio FHC – disputavam palmo a palmo a liderança. Nos oito anos de mandato do presidente-sociólogo, surgiram mais dois nomes fortes: Geraldo Alckmin e Aécio Neves.
Em 2002, Serra, todo-poderoso ministro da Saúde, foi o sucessor natural, mas até consolidar-se teve de enfrentar Paulo Renato Souza, que vinha de uma bem-avaliada gestão no MEC. A preferência pelo atual ministro das Relações Exteriores foi sacramentada por uma madrinha imbatível – Ruth Cardoso, mulher de FHC, falecida em 2008, que tinha uma grande admiração por ele.
Em 2006, Serra e Alckmin começaram duelando pela vaga à Presidência para enfrentar Lula, que fizera festejado primeiro mandato, escorregara no mensalão, mas recuperara terreno. Além disso, os resultados que podia apresentar na economia eram imbatíveis, e ele dificilmente perderia. Serra pesou bem essa variável-chave e, apesar de haver demorado a se decidir, abriu espaço para o governador, que perdeu no segundo turno depois de largar na frente.
Em 2010, Aécio e Serra travaram uma briga de morte pela indicação para disputar a Presidência, a ponto de haver circulado a informação de que Aécio teria estimulado a publicação do livro “A Privataria Tucana”, de Amaury Ribeiro, para ferir o adversário. Tratava-se de uma pesquisa pouco convincente denunciando supostas irregularidades sobre a venda de estatais na era FHC, quando Serra era ministro do Planejamento e chefe da comissão que cuidava do assunto. Aécio negou qualquer relação com a história, divulgada em forma de campanha anti-Serra – que perdeu a Presidência porque ninguém venceria Dilma Rousseff, indicada por um Lula superpopular e com a economia bombando. O PIB cresceu 7,5%.
Depois disso, o eixo de disputa tornou-se triangular: Aécio x Alckmin x Serra. Em 2014, Aécio tomou de assalto a presidência do PSDB e bloqueou a presença de Serra mesmo em cargos burocráticos, enquanto Alckmin quase o deixava sem legenda na disputa para o Senado. Aécio uniu o partido como só aconteceu na primeira campanha de FHC, mas os tucanos perderam pela terceira vez o comando do Executivo nacional para o PT de Lula, com Dilma mentindo de forma desconcertante sobre a crise.
Hoje, o tucano mais forte é o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, graças à vitória arrasadora de João Doria Jr. – invenção sua – na eleição para prefeito da capital paulista e às seguidas derrotas de Aécio em Minas Gerais. Alckmin não aceita menos do que a presidência do PSDB e a candidatura para presidente.
José Serra e Aécio Neves, atual presidente da legenda, têm idêntica ambição, e, para conter Alckmin, ambos engendraram uma aliança de conveniência – na prática, mais tática do que estratégica. Adiante, vão se separar. Correm o risco de serem demolidos pela operação Lava Jato. Mas, como diria Serra, “treino é treino”. Jogo mesmo, só em 2018.